O Brasil perdeu, nos primeiros dias de 2020, aos 81 anos de idade, um de seus cidadãos mais brilhantes (e, no entanto, praticamente anônimo, uma vez que, modesto como era e pouco dado a falar de si, rejeitava toda e qualquer publicidade pessoal). Desde 9 de janeiro infelizmente Imai já não está entre nós e, assim, não irá reclamar por eu estar revelando aqui algumas de suas qualidades.
Pai e marido amoroso, amigo leal e cidadão ético, sua vida pessoal foi exemplar. Entretanto, é sua trajetória empresarial e profissional que daria vários romances: filho de imigrantes japoneses e nascido de família numerosa do meio rural, Imai fez-se por si mesmo, tendo rapidamente galgado altos postos na publicidade, chegando bem jovem ao ápice dessa carreira no Brasil.
Antes disso, muito jovem ainda, já havia sido recrutado para ser intérprete de geólogos japoneses recém-chegados ao Brasil, contratados para avaliar a viabilidade econômica de uma mina de cobre pertencente ao empresário Baby Pignatari, no interior do Rio Grande do Sul. Imai permaneceu como interlocutor entre japoneses e brasileiros, nesse lugar, por cerca de dois anos, mas não se limitou a esse trabalho: aproveitando o tempo, convenceu a direção da mina a pôr em prática (e dirigiu pessoalmente) um oportuno projeto de melhoria das condições de vida das pobres famílias dos mineiros, incluindo a formação de hortas cultivadas colaborativamente e a criação de uma cooperativa dos empregados. E ele tinha então, se tanto, vinte anos de idade!
Na publicidade, aos 40 anos, já como VP de uma das maiores agências internacionais operando no Brasil, surpreendeu seus colegas e superiores ao decidir deixar essa carreira para buscar desafios em outras áreas. Estudou, então, o mercado internacional da Educação Corporativa e, em poucos anos, criou uma empresa modelar, que dirigiu por cerca de quatro décadas, até o ano passado, com o propósito de oferecer conhecimento tecnológico e de gestão de ponta a altos executivos (em especial do Brasil e da América Latina), que estavam sequiosos por aperfeiçoar a produtividade e a qualidade dos resultados em suas fábricas. Essa empresa é a IMC Internacional, idealizada por ele e dirigida nos últimos anos com a ajuda de uma das filhas, Gisella.
Imai foi também dirigente mundial da Câmara Júnior, organização que prepara jovens para o mundo executivo e empresarial; e, nesta, organizou congressos e seminários pelo mundo afora. Aliás, meticuloso como era e tendo um excepcional senso de oportunidade, realizava eventos internacionais de grande complexidade com tal qualidade, que tudo, absolutamente tudo, acontecia como planejado e no timing certo. Paralelamente, foi também RP da Japan Airlines por um tempo, e adorava viajar. Aliás, viajou como ninguém (uma vez mencionou-me que gostaria de escrever um livro com dicas aos executivos sobre como fazer viagens perfeitas – mas infelizmente não chegou a concretizar essa ideia). Somente ao Japão ele foi, sem sombra de dúvida, pelo menos 120 vezes. E também esteve em incontáveis cidades do planeta. (Numa palestra, certa vez, ele próprio surpreendeu-se ao não conseguir responder à pergunta despretensiosa de uma jovem na plateia: “Em quais países o senhor não esteve?”).
Com parceiros locais, idealizou e realizou nos anos 1980, em São Paulo, eventos de grande repercussão, de divulgação de abordagens de gestão em áreas distintas: Educação Corporativa (evento: Brasil Training), Recursos Humanos (RH Brasil), Logística (Logistech) e Qualidade (Qualitech). Cada evento desses, com duração de uma semana, incluía 50 palestras feitas por expoentes nessas áreas, que eram assistidas por cerca de 400 ou 500 profissionais de empresas.
Por sua empresa, a IMC, Imai liderou mais de 50 missões de estudo de executivos em visitas a empresas e outras instituições, ao Japão, Estados Unidos, Coreia do Sul e oito ou dez países europeus. Tornou-se uma referência internacional nos métodos TPM (originado no Japão) e TPM² (um upgrade de sua própria lavra), tendo capacitado nestes mais de 20 mil profissionais de pelo menos 14 países.
Foi um impulsionador do movimento da Qualidade no Brasil, aproximando os brasileiros das técnicas japonesas de gestão da produção desenvolvidas pelo Sistema Toyota de Produção, que conhecia como ninguém. Nos dois últimos anos interessou-se pelo desenvolvimento da China, pensando em como os empresários deste lado do mundo poderiam se beneficiar conhecendo o que acontecia por lá. Sentia-se especialmente fascinado pelo projeto chinês da “nova Rota da Seda”; e, para saber dela, já havia viajado recentemente por duas vezes, a Pequim, Shenzhen e outras cidades.
Nos últimos meses de 2019, Imai esteve pensando seriamente no que faria com sua invejável biblioteca, de vários milhares de volumes (formada principalmente por livros em inglês, espanhol e português e por uma quantidade inacreditável de relatórios sobre projetos técnicos desenvolvidos em empresas, por seus vinte mil alunos). Considerou a possibilidade de disponibilizá-los para consultas, em alguma universidade, a professores e alunos de pós-graduação. Sei que chegou a combinar com a Unifatea, sediada em Lorena-SP, a cessão à instituição de apenas uma parte desse acervo. A Unifatea, pelo que sei, o homenageará, dando seu nome a uma ala especial da biblioteca.
Imai tem apenas um livro publicado, e não é um livro técnico-científico. Trata-se de um magnífico depoimento dele e da filha Gisella primorosamente confeccionado pela Somos Editora de São José dos Campos e lançado em 2019, chamado “Caminho de Santiago – 800 km de diálogo entre pai e filha”. Neste livro, ambos relatam as conversas pessoais que foram tendo, durante a experiência única de percorrerem juntos a rota francesa do Caminho de Santiago de Compostela, no norte da Espanha.