O termo robosourcing apareceu pela primeira vez para mim no livro “O futuro – Seis desafios para mudar o mundo”, do ex-vice–presidente dos EUA, Al Gore, traduzido para o português e publicado pela HSM.

(A propósito, esse é um livro maçudo, enorme, que percorre inúmeros temas, mas inclui uma peculiaridade que torna sua leitura incomparavelmente mais fácil – não sei por que praticamente ninguém tinha pensado nisso antes: antes de cada capítulo, é apresentada uma árvore de subtemas que se ramificam a partir do título (um “mind mapping”, portanto, que serve para guiar o leitor pelos meandros do extenso conteúdo. Vale a pena ver como isso funciona bem num livro de tantas páginas!)

Como não conhecia o termo robosourcing, fui pesquisar; e encontrei referências bastante interessantes. Basicamente, a questão abordada é a da disseminação e banalização dos robôs e da inteligência artificial na vida diária das pessoas (tomado o termo robô num sentido amplo, que inclui, sim, máquinas antropomórficas como aquelas apresentadas nos filmes de ficção científica e robôs para operações automatizadas em fábricas; mas igualmente dispositivos que já estão no nosso dia a dia, como os sistemas de busca do Google, procedimentos para oferta de produtos em sites (por exemplo, pela Amazon) e aplicativos de celulares. O que preocupa as pessoas que usam esse termo é, principalmente, a transferência de tarefas dos trabalhadores humanos para as máquinas, que já vem acontecendo há algumas décadas, mas se acentua cada vez mais aceleradamente, abarcando funções que requerem o uso de conhecimento cada vez mais sofisticado nas escolhas e decisões impostas pelo trabalho.

Até certo ponto, a ideia básica de que essa tendência estaria presente no mundo do trabalho já havia sido antecipada muitos anos atrás, quando se começou a falar em automação industrial e surgiu o termo “steel collar” (colarinho de aço), ao lado dos tradicionais “white collar” e “blue collar”, que designavam, pela cor usual dos jalecos então usados, respectivamente os trabalhadores de escritório e de fábrica.

A propósito, um artigo que particularmente me chamou a atenção na internet foi “Will the first generation of robot laborers be ridiculed by those opposing outsourcing?”, do vice-presidente da Cegedim Relationship Management, Richie Etwaru (vide em http://www.huffingtonpost.com/richie-etwaru/will-the-1st-generation-o_b_4628945.html), postado no Huffingtonpost em 22/01/2014.

Etwaru sugere primeiramente que robótica, conectividade, inteligência artificial e automação são processos irmãos, que tendem a convergir cada vez mais num mesmo sentido – e, em grande medida, esse sentido é a profunda mudança que haverá na execução do trabalho, generalizadamente.

Ele abre o conceito de “robô”, praticamente equiparando-o ao de “máquina”. Embora, argumenta, já se utilizem, portanto, “robôs” em larga escala no mundo de hoje (pode-se dizer, diz, que “minha máquina de lavar, meu aspirador de pó ou o drone anunciado pela Amazon são robôs”; e “o que Henry Ford realmente fez em sua época, ao popularizar o automóvel, foi substituir cavalos por robôs”), esses objetos não haviam sido, até o presente, olhados como “trabalhadores”, que concorreriam em pé de igualdade com os trabalhadores humanos – uma visão que se escancara através do termo “robosourcing”.

A primeira geração de trabalhadores-robôs, ele afirma, não deverá substituir trabalhadores do conhecimento, mas apenas trabalhadores manuais: os robôs serão ainda vistos por um bom tempo como “máquinas”, capazes de realizar com muito maior eficiência e precisão tarefas repetitivas e bem definidas.

Porém, com base no estado atual e no célere desenvolvimento da tecnologia, logo estaremos utilizando robôs como trabalhadores em atividades diárias. “Prevejo, então, uma proliferação de atividades entregues a trabalhadores-robôs, o que lançará no mercado de trabalho uma quantidade tão grande de concorrentes dos trabalhadores humanos quanto hoje assistimos com o crescimento da força de trabalho global, pela incorporação de milhões de novos trabalhadores chineses e indianos, o que interferirá profundamente na atual tendência ao crescimento dos fluxos migratórios dos países menos desenvolvidos para os mais desenvolvidos”.
Etwaru acredita que ele próprio, nos anos de vida que tem pela frente, atingirá a época em que haverá robôs de uso pessoal, que poderão, talvez, aprender algumas de suas habilidades e substituí-lo (como a qualquer ser humano possuidor de um desses “clones”) em tarefas manuais e outros encargos relativamente simples, poupando seu dono para atividades mais nobres.

Etwaru questiona, ainda, a tese de que os trabalhadores que hoje operam equipamentos sofisticados baseados em automação e inteligência artificial sejam de fato trabalhadores do conhecimento (como se costuma denominá-los, aproveitando-se a expressão divulgada por Peter Drucker há alguns anos). Na verdade, afirma, cada onda de inovação tecnológica captura e transforma em commodity uma multiplicidade de novas tarefas que até então exigiam reflexão e raciocínio em níveis somente alcançados por seres humanos, e que podem, a partir de então, ser rotuladas de repetitivas e automatizáveis, passando a ser objeto de robosourcing.

Dentro dessa linha de raciocínio, boa parte dos atuais trabalhadores do conhecimento não passa, segundo ele, de “trabalhadores manuais modernos”, que estão para os atuais níveis de desenvolvimento da tecnologia, no nível em que estavam os operários qualificados das fábricas, nos anos 50.

A fronteira que separa, portanto, os “processadores de informação” (para usar outro termo de Drucker) dos “trabalhadores do conhecimento” está cada vez mais rapidamente se afastando para novos estágios de desenvolvimento tecnológico, em grande parte ainda inimagináveis.